Direito do Consumidor

Paulo Corrêa | Advocacia|Direito do Consumidor
Áreas de Atuação

Direito do Consumidor

A atuação prática no Direito do Consumidor, seja para o consumidor buscando seus direitos ou para o fornecedor se defendendo, envolve uma série de etapas e considerações importantes.

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Vamos detalhar os aspectos práticos mais relevantes:

Para o Consumidor:

  1. Identificação da Relação de Consumo:
  • Primeiro passo: Confirmar se há uma relação de consumo (Consumidor x Fornecedor x Produto/Serviço). Se for uma relação entre particulares, entre duas empresas (compras de insumos) ou de trabalho, o CDC não se aplica diretamente.
  1. Documentação e Provas:
  • Guarde TUDO: Notas fiscais, recibos, contratos, e-mails, conversas de WhatsApp, protocolos de atendimento (SAC), prints de tela de sites, fotos/vídeos do produto com defeito ou do serviço mal prestado, extratos bancários de pagamentos. Quanto mais provas, melhor.
  • Registros de Atendimento: Anote datas, horários e nomes dos atendentes em ligações para o SAC.
  1. Tentativa de Solução Amigável (Primeiro Contato com o Fornecedor):
  • SAC/Canais Oficiais: Entre em contato com o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) ou canais oficiais da empresa. Explique o problema de forma clara e objetiva.
  • Prazo para Resposta: Dê um prazo razoável para a empresa resolver. Anote os protocolos de atendimento.
  1. Órgãos Administrativos de Defesa do Consumidor:
  • PROCON: É o principal órgão de defesa do consumidor no âmbito estadual/municipal.
    • Como funciona: O consumidor registra a reclamação, apresenta as provas. O PROCON notifica a empresa, que tem um prazo para apresentar defesa e/ou proposta de solução. Pode haver audiência de conciliação.
    • Vantagens: Gratuito, rápido, busca a conciliação, e o PROCON pode aplicar multas à empresa se ela não cumprir a lei.
    • Limitações: Não tem poder para obrigar a empresa a pagar indenizações ou a fazer a troca/reparação se não houver acordo. A decisão é administrativa, não judicial.
  • Consumidor.gov.br: Plataforma online do governo federal que permite registrar reclamações contra empresas que aderiram ao serviço.
    • Vantagens: Prático, rápido, online, e muitas empresas buscam resolver por esse canal para manter boa reputação.
    • Limitações: A solução depende da boa vontade da empresa.
  • Anatel, Aneel, ANS (Agências Reguladoras): Para problemas específicos de telecomunicações, energia elétrica, planos de saúde, etc.
  1. Medidas Judiciais :
  • Juizados Especiais Cíveis (JEC): Para causas de menor complexidade e valor (até 40 salários mínimos).
    • Vantagens: Processo mais rápido, menos formal, não exige advogado para causas de até 20 salários mínimos (embora seja sempre recomendado). As custas são reduzidas ou isentas na primeira instância.
    • Limitações: Não cabem todos os tipos de ações e, se a causa for mais complexa, pode ser encaminhada para a Justiça Comum.
  • Justiça Comum: Para causas de maior valor ou complexidade, que exigem maior dilação probatória ou discussões mais aprofundadas.
    • Exigência: Sempre exige a presença de advogado.
    • Prazos e Custos: Mais demorado e com mais custas processuais.
  • Inversão do Ônus da Prova: Na prática, é um dos maiores trunfos do consumidor. Em muitos casos, o juiz pode determinar que o fornecedor prove que não houve falha, e não o consumidor provar que houve.
  • Ações de Indenização: Além da resolução do problema principal (troca, reparo, restituição), o consumidor pode pleitear indenização por danos morais (frustração, tempo perdido, abalo à honra) e/ou materiais (prejuízos financeiros diretos).
  1. Exemplos Práticos de Problemas Comuns:

Produto com Defeito (Vício do Produto)

  • Situação: Você compra um celular novo e, depois de duas semanas, ele para de funcionar sem motivo aparente.
  • Problema: O produto apresenta um vício (defeito) que o torna impróprio para uso ou diminui seu valor.
  • Como o CDC ajuda: O artigo 18 do CDC estabelece que o fornecedor (fabricante, produtor, construtor, importador) e o comerciante são solidariamente responsáveis pelo defeito. Eles têm um prazo de 30 dias para consertar o produto. Se não for consertado nesse prazo, o consumidor pode exigir, alternativamente:
    • A substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso.
    • A restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.
    • O abatimento proporcional do preço.
  • Dica: Guarde sempre a nota fiscal e, se possível, registre o problema com fotos ou vídeos.

Atraso na Entrega de Produtos

  • Situação: Você compra um eletrodoméstico online com prazo de entrega de 7 dias úteis, mas ele não chega.
  • Problema: O fornecedor não cumpre o prazo acordado para a entrega do produto.
  • Como o CDC ajuda: O atraso na entrega é considerado um descumprimento da oferta (artigo 35 do CDC). Nesses casos, o consumidor pode exigir, alternativamente:
    • O cumprimento forçado da entrega.
    • Aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente.
    • Rescindir o contrato, com direito à restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, além de perdas e danos (por exemplo, se você precisou comprar o item em outro lugar com urgência e pagou mais caro).
  • Dica: Sempre anote o prazo de entrega prometido e guarde comprovantes da compra e da comunicação com a empresa.

Cobrança Indevida 

  • Situação: Você recebe uma fatura de cartão de crédito com uma compra que não reconhece, ou uma conta de telefone com serviços que não contratou.
  • Problema: Cobrança de valores não devidos ou serviços não solicitados.
  • Como o CDC ajuda: O artigo 42 do CDC proíbe a cobrança vexatória e o parágrafo único desse artigo estabelece que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, ou seja, à devolução em dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo engano justificável do fornecedor.
  • Dica: Entre em contato com a empresa para contestar a cobrança e, se não resolver, procure um PROCON ou um advogado.

Publicidade Enganosa ou Abusiva 

  • Situação: Você compra um produto porque a propaganda prometia certas características (ex: “emagrecimento rápido sem esforço”), mas o produto não cumpre o prometido.
  • Problema: A publicidade induz o consumidor ao erro, apresentando informações falsas ou que podem levar a uma interpretação distorcida.
  • Como o CDC ajuda: O CDC (artigos 37 e 38) proíbe a publicidade enganosa (que induz o consumidor ao erro) e a abusiva (que discrimina, explora o medo, se aproveita da deficiência ou idade). O fornecedor que fizer publicidade enganosa ou abusiva pode ser obrigado a cumprir o que prometeu, além de estar sujeito a sanções e a reparar eventuais danos.
  • Dica: Guarde prints da publicidade, caso ela seja online, ou registre o anúncio para ter provas.

Contratos de Adesão com Cláusulas Abusivas 

  • Situação: Você assina um contrato de prestação de serviços (plano de saúde, internet, academia) e, depois, descobre que há cláusulas que o deixam em grande desvantagem, como multas altíssimas por cancelamento ou alteração unilateral de preços.
  • Problema: Cláusulas contratuais que colocam o consumidor em desvantagem exagerada, são incompatíveis com a boa-fé ou equidade.
  • Como o CDC ajuda: O CDC considera nulas as cláusulas contratuais que sejam abusivas (artigo 51). Isso significa que elas não têm valor legal e não podem ser exigidas do consumidor. O CDC também estabelece que, em caso de dúvida sobre a interpretação de uma cláusula, a interpretação mais favorável ao consumidor prevalecerá.
  • Dica: Sempre leia o contrato antes de assinar e, se algo parecer injusto, questione.

 Direito de Arrependimento em Compras Online (ou fora do estabelecimento) 

  • Situação: Você compra um produto pela internet, ele chega, mas você não gostou, não serviu, ou simplesmente se arrependeu da compra.
  • Problema: Você quer desistir da compra feita à distância.
  • Como o CDC ajuda: O artigo 49 do CDC garante o Direito de Arrependimento. O consumidor pode desistir da compra no prazo de 7 dias a contar da assinatura do contrato ou do recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial (online, por telefone, em domicílio, etc.). Nesses casos, o consumidor tem direito à devolução integral do valor pago, incluindo frete, e os custos de devolução do produto são do fornecedor.
  • Dica: Exercer esse direito é fundamental para compras online. Comunique o fornecedor por escrito (e-mail é bom) dentro do prazo.

Atraso e Cancelamento de Voo

Um dos problemas mais comuns e estressantes. Os direitos do passageiro variam conforme o tempo de espera:

  • A partir de 1 hora de atraso: A companhia aérea deve fornecer comunicação e acesso à internet.
  • A partir de 2 horas de atraso: A companhia deve oferecer alimentação (voucher, refeição, lanche, etc.).
  • A partir de 4 horas de atraso:
    • Acomodação ou hospedagem: Se for pernoite no aeroporto, a empresa deve providenciar.
    • Transporte do aeroporto ao local de acomodação e vice-versa.
    • Opções ao passageiro:
      • Reacomodação em outro voo (próprio ou de outra companhia).
      • Reembolso integral do valor da passagem (inclusive da taxa de embarque).
      • Reembolso integral e retorno ao aeroporto de origem: Se o voo já estiver em andamento, o passageiro tem direito a voltar ao ponto de partida sem custos adicionais e ter o valor total da passagem devolvido.
  • Cancelamento de Voo: Os direitos são os mesmos do atraso a partir de 4 horas, com as mesmas opções de reacomodação, reembolso ou retorno. A empresa deve comunicar o cancelamento com 72 horas de antecedência se o voo for doméstico, ou 24 horas se o voo for internacional, ou em caso de motivos de força maior (condições climáticas adversas, por exemplo).

Para o Fornecedor

1. Prevenção é o Melhor Remédio:

  • Compliance e Treinamento: Capacitar funcionários sobre o CDC e boas práticas de atendimento.
  • Contratos Claros: Elaborar contratos de consumo com linguagem simples e cláusulas claras, evitando abusividades.
  • Canais de Atendimento Eficientes: Ter um SAC funcional para resolver problemas internamente, antes que escalem.
  • Política de Trocas e Devoluções: Definir e divulgar uma política clara, que esteja em conformidade com o CDC.
  • Publicidade Responsável: Assegurar que a publicidade seja verdadeira e não enganosa.

2. Atuação em Caso de Reclamação:

  • Análise Rápida da Reclamação: Avaliar a procedência da reclamação e as provas do consumidor.
  • Resolução Interna Prioritária: Tentar resolver a questão de forma rápida e satisfatória para o consumidor, evitando que a demanda chegue ao PROCON ou ao Judiciário.
  • Atendimento ao PROCON/Consumidor.gov.br: Responder às notificações e participar de audiências, apresentando a defesa e/ou propostas de acordo.
  • Defesa Judicial: Caso a ação chegue ao Judiciário, o advogado do fornecedor deve:
    • Analisar a Petição Inicial: Identificar os pedidos, as provas e os fundamentos do consumidor.
    • Elaborar a Contestação: Apresentar a defesa da empresa, contestando os fatos ou os direitos pleiteados, e anexando as provas que demonstrem a regularidade da conduta da empresa.
    • Produção de Provas: Apresentar documentos, pedir perícias (se for o caso de vício do produto), arrolar testemunhas para sustentar a defesa.
    • Audiências: Participar das audiências, buscando a conciliação ou defendendo os interesses da empresa.
    • Recursos: Interpor recursos, se necessário.

3. Aspectos Relevantes para Fornecedores:

  • Responsabilidade Objetiva: Na maioria dos casos, o fornecedor responde pelos danos causados independentemente de culpa (basta o dano e o nexo de causalidade). Há exceções, mas a regra é essa.
  • Teoria do Risco do Negócio: A empresa assume os riscos da sua atividade econômica, o que inclui a possibilidade de seus produtos ou serviços causarem danos.
  • Dever de Qualidade e Segurança: Produtos e serviços devem ser seguros e adequados ao fim que se destinam.
  • Atendimento aos Prazos do CDC: Respeitar os prazos para sanar vícios, para exercício do direito de arrependimento, etc.

Em resumo, a atuação prática no Direito do Consumidor exige do advogado uma visão estratégica para proteger o cliente, seja ele consumidor ou fornecedor. Para o consumidor, a chave é a documentação e a persuasão. Para o fornecedor, a prevenção e a resolução célere dos problemas são essenciais para evitar litígios e preservar a reputação. Entender o Direito do Consumidor na teoria é fundamental, mas o valor real está em saber como ele se aplica no dia a dia. Aqui, vamos explorar os aspectos práticos, ou seja, as situações mais comuns que os consumidores enfrentam e como agir para defender seus direitos.